quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A Nova Ideologia do Trabalho: Ferramenta de Controle social durante a Primeira República no Brasil

Durante a “Primeira República”, houve empenhos por parte dos governantes em se estabelecer novos padrões comportamentais para a sociedade brasileira. A intenção era a completa desvinculação da idéia monárquica e também apagar as marcas do colonialismo. Neste respeito, temos a formação de uma nova ideologia do trabalho, que foi pensada, pode-se dizer a partir de 1870, onde já se visualizava o fim da escravidão pela cor, e, portanto haveria a necessidade de novas diretrizes que regessem o trabalho livre. Mas, a criação dessa nova ideologia do trabalho, atendia aos interesses de quem? Que efeito essa ideologia trabalhista teve sobre os brasileiros?

Baseado nos textos de Sidney Chalhoub, “Trabalho, lar e botequim”, e de Hildete Pereira de Melo, “O caso da Cervejaria Brahma”, farei uma abordagem sobre essa temática, a nova ideologia trabalhista e seus efeitos sobre os brasileiros. Esclareço, porém, que esta abordagem será de superfície, sem pretensões, pelo menos por hora, de se chegar a um aprofundamento nesta discussão.

Sidney Chalhoub começa sua analise a partir das rixas e conflitos que ocorreram entre membros da classe trabalhadora do Rio de Janeiro na primeira década do século XX. Utilizando-se de processos criminais, jornais e textos literários, Chaulhoub nos mostra como se articulou esse movimento para se passar uma valoração positiva de “ordem” e “progresso” ao trabalho.

Sobretudo, o alvo que se tem com a nova ideologia trabalhista, é, segundo Chalhoub, atingir a “mente” ou o “espírito” dos brasileiros. A pretensão foi de que se assimilasse a idéia de que o trabalho era um bem, era, aliás, o maior bem que restava aos brasileiros que foram expropriados dos seus anteriores “meios de produção”. O trabalho seria a força que impulsionaria a nação rumo ao “novo”, rumo a “civilização”, rumo aos costumes civilizados das nações européias avançadas, e que todos os brasileiros deveriam buscar ser iguais. Essa era a ideologia que se pregava na época.

Hildete Pereira Melo nos apresenta uma analise feita junto a Cervejaria Brahma, na cidade do Rio de Janeiro, com enfoque no período de 1925 a 1935. Foram utilizados os registros de funcionários, a partir do fichário rosa, onde das cerca de 2100 fichas se selecionou 567 registros, sendo destes, 385 provindos da letra J, na sua totalidade de arquivo e demais parciais como: 53 registros da letra A, 35 da letra G, 45 da letra H e 49 da letra O.

Melo teve como objetivo encontrar o que os registros trabalhistas, da Cervejaria Brahma, apontavam sobre a situação financeira da classe trabalhadora, compreendendo assim até que ponto estes estava envolvido social, econômica e politicamente nas questões que existiam na primeira metade do século XX na cidade do Rio de Janeiro. Melo utiliza autores como Versiani (1993) e Vilela e Suzigan (1975), que sustentam que houve um grande numero de imigrantes na cidade Carioca, até maior do que São Paulo. Apontam também para os altos salários existentes na cidade, o que pode ter ocasionado um desgaste trabalhista e consequente efeito inibidor na indústria.

Outra corrente de historiadores aponta para o sistema de abastecimento de gêneros para a cidade, como o grande vilão em relação ao aumento dos salários e do alto custo de vida no Rio de Janeiro.

Os imigrantes fixavam residência no Rio e se inseriam no mercado de trabalho, como diz Melo, com os mesmos dilemas que os brasileiros, ou seja, recebiam salários aviltados e se submetiam a longas jornadas de trabalho.

A partir desta primeira visão, notamos que a ideologia do trabalho, apresentava como pessoa de bem apenas aqueles que estivessem inseridos no mercado de trabalho. Mesmo que a pessoa tivesse um trabalho informal, ainda recairia sobre ele o estigma de contra lei.

Chalhoub diz que existiu um grande antagonismo referente a “trabalho assalariado versus capital”, onde o homem “livre” ou “expropriado” é figura central nesse “mercado capitalista” do “trabalho assalariado”. Os governantes viam a necessidade de gerirem uma “transformação” do brasileiro em alguém que estivesse integrado ao mercado de trabalho com sua ideologia política/trabalhista.

As manobras foram feitas, as idéias foram disseminadas e utilizando da força repressora policial e jurídica, que segundo Chalhoub, estigmatizava os brasileiros sem ocupação como “vadios”, “promíscuos” e “desordeiros”, podendo ser presos a qualquer momento, simplesmente pelo fato de estarem sem trabalho e serem criminosos em potencial. Assim, os brasileiros foram levados a entrarem nas leis do mercado de trabalho assalariado, passando a compor o que Chaulhoub chamou de “relação burguês-capitalista”.

Notamos nesta exposição de Chalhoub, que o trabalho passou a ser uma ferramenta governamental de controle a sociedade. A repressão a quem não estivesse integrado no mercado de trabalho, fez com que as pessoas estivessem dispostas a se sujeitarem a trabalhos forçados, aceitassem longas jornadas de serviço, recebessem salários indignos, trabalhassem em péssimas condições e ainda teriam que se dar por satisfeitos, pois estar fora do mercado de trabalho era estar exposto aos preconceitos e punições por parte da força de policia e jurídica.

Hildete Melo nos apresenta por sua vez, a composição do mercado trabalhista e chega à conclusão de que há um favorecimento dos portugueses e demais europeus em relação aos brasileiros (brancos, negros, pardos). Melo diz que esse favorecimento não estava ligado a instrução educacional ou ao preparo com respeito às técnicas de serviço, mas sim, teve haver com a nacionalidade. Isto levou os brasileiros a ocuparem, na sua maioria, as ocupações braçais que tinham remuneração inferior. Fazendo uma comparação média salarial, Melo nos mostra o seguinte quadro: salário médio dos brasileiros (184,618), dos portugueses (240,379), dos europeus (281,766).

Esse quadro desfavorável aos brasileiros se deu em partes por serem operários sem qualificação, chegando a comporem 63% dos operários na empresa. Mas relembrando a conclusão de Melo, vigorava na época a ideologia de “superioridade dos imigrantes”, eles gozavam de maior confiabilidade e eram vistos como de maior eficiência em relação ao trabalho industrial.

Melo nos leva a conclusão de que o preconceito contra os brasileiros não é algo dos nossos dias. Os governantes e os imigrantes disseminaram o estigma de que os brasileiros são preguiçosos, maus trabalhadores e despreparados. Esse estigma negativo acompanha os brasileiros a décadas e só em anos recentes é que se tem feito um trabalho par recuperação da auto estima do trabalhador brasileiro. Durante os anos, notamos também que a ideologia expansionista européia estava sendo disseminada na nação-colônia. Os europeus se gabam de serem os detentores das tecnologias, dos avanços e se dizem aptos para atingirem a felicidade. Seu objetivo sempre foi o domínio sobre os povos “não civilizados”, segundo o que pensam. Mas, olhando para atual situação européia e brasileira, quem podemos dizer que esta em melhor situação? Quão Nobre era realmente o papel das nações européias, na condução a uma vida melhor das nações sem desenvolvimento? Uma olhada no mundo e podemos ver que afinal, os europeus não têm tanta eficiência assim.

Referências Bibliográficas:

CHALHOUB, Sidney. Trabalho, lar e botequim. O cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle époque. Campinas: Editora da Unicamp.

MELO, Hildete Pereira de; João Lizardo de Araújo; Teresa Cristina de Novaes Marques. Raça e Nacionalidade no mercado de Trabalho Carioca na Primeira República: O Caso da Cervejaria Brahma. RBE, Rio de Janeiro, 2002.


5 comentários:

Por um momento estivemos juntos, ligados pelas ideias. Foi muito bom! Nos encontramos em breve! Tchau!

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