Núcleo
Livre – História da Educação dos Negros no Brasil
A partir da leitura do texto de Marcus
Vinicius Fonseca justifique a afirmação:
“[...] a Educação foi apresentada,
durante os debates para a abolição da escravidão, como um dos elementos
necessários para viabilizar a transição dos ex-escravos para uma sociedade
organizada a partir do trabalho livre”. (FONSECA, 2000:96)
Marcus Vinicius Fonseca faz uma
abordagem da educação dos negros no Brasil relacionando com a abolição do
trabalho escravo. No decorrer do seu texto, Fonseca, mostra que a abolição do trabalho
escravo e a educação, foram apresentadas como atividades paralelas e
complementares no processo de transição para uma sociedade organizada a partir
do trabalho livre.
Em
1871 foi criada a Lei do Ventre Livre, que supostamente dava liberdade às crianças
nascidas de mães escravas. Fonseca e outros historiadores, no entanto, com boa
razão, vêem nesta Lei do Ventre Livre uma manobra, ou pelo menos, que esta, foi
utilizada como uma manutenção do trabalho não remunerado. Se por um lado havia
o compromisso, do senhor tutelar de dar uma educação, que preparasse o nascido
livre para uma vida adulta produtiva, na prática não foi bem assim que
funcionou, pois com a reinterpretação da Lei, os senhores não só tinha um
trabalhador não remunerado, por longos anos, como às vezes recebiam benefícios
do Governo, na condição de tutelador.
A
educação dos negros no Brasil, segundo Fonseca, não exerceu uma influência
significativa no modelo de abolição que se efetivou em 1888, constituindo um
modelo de poucas fontes para estudo. Porém, a educação fez parte do projeto de
transição da sociedade escravista para uma sociedade com trabalho livre.
Portanto, mesmo sem grande menção, a educação dos negros existiu e a alguns
serviu de beneficio.
D. Pedro II, no ano de 1867, apresentou
ao parlamento a questão da emancipação dos escravos no Brasil. Em sua fala, D.
Pedro II, mostrou, porém, que estava mais preocupado com os interesses dos
senhores de escravos, do que com a própria situação dos escravos em si. Ele
mencionou que a emancipação seria inevitável, porém deveria se levar em conta a
propriedade privada e adotar ações que não abalassem a principal fonte de renda
econômica do país: a agricultura. Por isso, o ideal era que a abolição do
trabalho escravo ocorresse de forma lenta e gradual. A melhor forma neste caso
era estabelecer a liberdade às novas gerações que nasceriam no cativeiro,
mantendo a escravidão de seus pais.
O Deputado, Perdigão Malheiros, no
mesmo ano de 1867, criou um projeto, que tinha como finalidade dar liberdade
aos nascidos em cativeiro. Esse projeto de Malheiros serviu de discussão no
parlamento, sobre a questão da emancipação dos escravos, e por fim quando a Lei
do Ventre Livre foi aprovada, em 1871, tinha o projeto de Malheiros como base.
Embora, ele próprio tenha votado contra o estabelecimento da Lei do Ventre
Livre, mas segundo Fonseca, por motivos de desavença política, quando o seu
nome não foi aprovado para ocupar uma cadeira no parlamento.
A Lei do Ventre Livre, aprovada a
partir do projeto de Malheiros, considerava que os escravos deveriam ser
preparados para a liberdade. Esta preparação se daria pela adoção de
estratégias educacionais que preparassem os nascidos de escravos, para a
liberdade. O ideal da educação para os negros, é que esta agregasse tanto a
educação moral e religiosa, como também incluísse o preparo para o trabalho,
através do aprendizado de um ofício mecânico, no caso dos homens, e prendas
domésticas no caso das mulheres.
Nestes
moldes, Fonseca, reconhece que a abolição esteve articulada a educação como
dimensões paralelas e complementares. Não havia de nenhuma parte discordância
quanto ao benefício da educação na preparação para uma transição tranquila
entre sociedade escravista e sociedade do trabalho não remunerado. A divergência
que surgiu, tinha a haver com “quem” daria essa educação às crianças que
nascessem livres. Caberia ao Estado a educação dos emancipados, visto se tratar
de uma Lei criada pelo Estado, ou esta tarefa deveria ser atribuída aos
senhores de escravos, visto que os nascidos livres, ficariam sob a tutela deste
até os 21 anos?
As
discussões, e as pressões dos senhores de escravos, levou a se fazer ajustes no
que determinava a Lei do Ventre Livre. Estes ajustes favoreciam, é claro, aos
próprios senhores. A Lei passou a determinar que os nascidos livres fossem
tutelados, dos senhores de escravos, até os seus 8 anos, após o que, seriam, ou
entregues ao Estado, que pagaria ao senhor uma indenização, ou permaneceriam na
propriedade, prestando serviços sem remuneração até os 21 anos, conquistando
então sua liberdade.
No final das contas os que fossem
entregues ao Estado receberiam a educação emancipadora, no entanto, os que
permanecessem na propriedade, não receberiam essa educação. Isto se deu pelo
entendimento que se estabeleceu a respeito de “criar” e “educar”. Criou-se uma
oposição entre esses dois termos. Criar passou a ser entendido como
simplesmente ter que se cercar de certos cuidados para que o menor, não
morresse, chegando à idade adulta. Porém, não havia a obrigação de prover uma
educação emancipadora que o preparasse para os anos futuro, em liberdade. Pelo
termo educar, o entendimento era de que se deveria prover o ensino de valores
morais e religiosos, o ensino de uma profissão e a instrução nas primeiras letras.
Fonseca cita Mattoso (1988) quando
este fala sobre crianças nascidas livres serem devolvidas à escravidão. Criar,
portanto, objetivava somente explorar os menores como trabalhadores até os 21
anos, aplicando praticamente os mesmos padrões educacionais que eram dirigidos
aos escravos.
Fonseca aponta para outra questão
que passa a se tornar comum, o que pode significar uma manobra para a
manutenção do trabalho escravo. A partir de 1870, se torna uma opção
generalizada dos senhores reter as crianças em suas propriedades. A partir de
1879, o interesse dos senhores abrangia não só os nascidos em cativeiro, como
também os órfãos. Os senhores de escravos passaram a ambicionar não apenas
criar as crianças nascidas livres de mães escravas, mas também trazer crianças
órfãs para serem “educadas” em suas fazendas. Fonseca considera que esta pode
ter sido uma forma de os senhores resolverem os problemas relativos à falta de
mão-de-obra. Após a abolição em 1888, esses senhores puderam manter e até mesmo
acrescentar outros órfãos à sua tutela, para serem “educados”, enquanto
prestavam serviços não remunerados, em retribuição aos cuidados prestados a
estes.
Portanto, Fonseca menciona que a Lei
que, em 1871, viera atacar indiretamente a escravidão, em 1888, permitiu que
algumas crianças continuassem presas a uma situação próxima ao cativeiro e não
fossem beneficiadas pela liberdade conquistada por todos os negros
escravizados.
Conclui-se
que a educação foi apresentada como elemento necessário para viabilizar a
transição dos ex-escravos para uma sociedade organizada a partir do trabalho
livre. A educação dos negros gerou debates, criando até mesmo uma política
pública para educação dos negros, segundo Fonseca. Porém, os interesses
escravistas eram os que prevaleciam no Império. Estes interesses oprimiram as
políticas voltadas para a educação dos ex-escravos e em muitos casos, foram
utilizadas como manutenção do trabalho não remunerado.