sábado, 31 de agosto de 2013

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1993. (Fichamento e Resenha)

Fichamento Citação
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1993.
Capítulo 1
A Cultura
O homem é um ser que fala. A palavra se encontra no limiar do universo humano, pois caracteriza fundamentalmente o homem e o distingue do animal”. [...] “Poderíamos dizer, porém, que os animais também têm linguagem. Mas a natureza dessa comunicação não se compara à revolução que a linguagem humana provoca na relação do homem com o mundo”. [...] “Assim, a linguagem animal visa à adaptação à situação concreta, enquanto a linguagem humana intervém como uma forma abstrata que distancia o homem da experiência vivida, tornando-o capaz de reorganizá-la numa outra totalidade e lhe dar novo sentido”. (p.4).
“É por isso que podemos dizer que, mesmo quando o animal consegue resolver problemas, sua inteligência é ainda concreta. Já o homem, pelo poder do símbolo, tem inteligência abstrata.”. [...] “Se a palavra, que distingue o homem de todos os seres vivos, se encontra enfraquecida na possibilidade de expressão, é o próprio homem que se desumaniza”. (p.5).
“A cultura é, portanto, um processo de auto-liberação progressiva do homem, o que o caracteriza como um ser de mutação, um ser de, que ultrapassa a própria experiência”. [...] “O mundo cultural é um sistema de significados já estabelecidos por outros, de modo que, ao nascer, a criança encontra o mundo de valores já dados, onde ela vai se situar”. (p.6).
“Todas as diferenças existentes no comportamento modelado em sociedade resultam da maneira pela qual os homens organizam as relações entre si, que possibilitam o estabelecimento das regras de conduta e dos valores que nortearão a construção da vida social, econômica e política”. (p.7).
“assim como a massificação pode ser decorrente da aceitação sem crítica dos valores impostos pelo grupo social, também é verdade que a vida autêntica só pode ocorrer na sociedade e a partir dela. Aí reside justamente o paradoxo de nossa existência social, pois, como vimos, o processo de humanização se faz pelas relações entre os homens, e é dos impasses e confrontos dessas relações que a consciência de si emerge lenta mente. O homem move-se, então, continua mente entre a contradição e sua resolução”. (p.7)
 “Portanto, a sociedade é a condição da alienação e da liberdade, é a condição para o homem se perder, mas também de se encontrar”. (p.7)
 “A função de "estranhamento" é fundamental para o homem desencadear as forças criativas, e se manifesta de múltiplas formas: quando paramos para refletir na vida diária, quando o filósofo se admira com o que parece óbvio, quando o artista lança um olhar novo sobre a sensibilidade já embaçada pelo costume, quando o cientista descobre uma nova hipótese”. (p.7)
“O "sair de si" é remédio para o preconceito, o dogmatismo, as convicções inabaláveis e, portanto paralisantes. É a condição para que, ao retornar de sua "viagem", o homem se torne melhor”. (p.7)
Capítulo 2
Trabalho e Alienação
“O trabalho estabelece a relação dialética entre a teoria e a prática, pela qual uma não pode existir sem a outra: o projeto orienta a ação e esta altera o projeto, que de novo altera a ação, fazendo com haja mudança dos procedimentos empregados, o que gera o processo histórico”. (p.9)
“[...] ‘Todo trabalho trabalha para fazer um homem ao mesmo tempo que uma coisa’, disse o filósofo personalista Mounier”. (p.9)
“Marx retoma a temática hegeliana, mas critica a visão otimista do trabalho ao demonstrar como o objeto produzido pelo trabalho surge como um ser estranho ao produtor, não mais lhe pertencendo: trata-se do fenômeno da alienação”. (p.11)
“Em Hegel também surge o conceito de alienação. Em sua perspectiva, ela corresponde ao momento em que o espírito “sai de si” e se manifesta na construção da cultura”. (p.11)
“[...] o consumo não-alienado supõe, mesmo diante das influências externas, que o individuo mantenha a possibilidade de escolha autônoma, não só para estabelecer suas preferências como para optar por consumir ou não”. (p.15)
“Além disso, o consumo consciente nunca é um fim em si, mas sempre um meio para outra coisa qualquer”. (p.15)
“Num mundo em que predomina a produção alienada, também o consumo tende a ser alienado. A produção em massa tem por corolário o consumo de massa”. (p.16)
“O problema da sociedade de consumo é que as necessidades são artificialmente estimuladas, sobretudo pelos meios de comunicação de massa, levando os indivíduos a consumirem de maneira alienada”. (p.16)
“O lazer é criação da civilização industrial, e aparece como um fenômeno de massa com características especiais que nunca existiram antes do século XX”. (p.17)
“No mundo em que a produção e o consumo são alienados, é difícil evitar que o lazer também não o seja. A passividade e embrutecimento naquelas atividades repercutem no tempo livre”. (p.18)
“A propaganda da bem-montada “indústria do lazer” orienta as escolhas e os modismos, manipula o gosto, determinando os programas:...”. (p.18)
Capítulo 5
Ideologia
“[...] senso comum e o conhecimento adquirido por tradição, herdado dos antepassados e ao qual acrescentamos os resultados da experiência vivida na coletividade que pertencemos”. (p.35).
“[...] o senso comum precisa ser transformado em bom senso, este entendido como a elaboração coerente do saber e como explicação das intenções conscientes dos indivíduos livres”. (p.35)
“Qualquer pessoa, não sendo vítima de doutrinação e dominação, e se for estimulada na capacidade de compreender e criticar, torna-se capaz de juízos sábios porque vitais, isto é, orientado para sua humanização”. (p.35)
“[...] ideologia... é o conjunto de idéias, concepções ou opiniões sobre algum ponto sujeito a discussão”. (p.36)
“Ainda podemos nos referir à ideologia enquanto teoria, no sentido de organização sistemática dos conhecimentos destinados a orientar a ação efetiva”. (p.36)
“[...] Gramsci considera que em um primeiro momento, enquanto concepção de mundo, a ideologia tem a função positiva de atuar como cimento da estrutura social. Quando incorporada ao que chamamos senso comum, ela ajudará a estabelecer o consenso, o que em última análise confere hegemonia a uma determinada classe, que passará a ser dominante”. (p.36)
“A universalidade das idéias e dos valores PE resultado de uma abstração, ou seja, as representações ideológicas não se referem ao concreto, mas ao aparecer social”. (p.37)
“[...] a universalização e a abstração supõem uma lacuna ou o ocultamento de alguma coisa que não pode ser explicitada sob pena de desmascaramento da ideologia. Por isso a ideologia é ilusória, não no sentido de ser “falsa” ou “errada”, mas enquanto uma aparência que oculta a maneira pela qual a realidade social foi produzida. Isto é, sob o aparecer da ideologia existe a realidade concreta que precisará ser descoberta pela análise da gênese do processo”. (pp.37-38)
Resenha:
Apresentação do autor
Maria Lúcia de Arruda Aranha Nasceu em Três Lagoas, Mato Grosso do Sul. Formada em Filosofia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Lecionou para o Ensino Médio em escolas da rede pública e particular, até se aposentar. Em parceria com Maria Helena Pires Martins, é autora de "Filosofando - introdução à filosofia" e "Temas de filosofia", publicados pela Editora Moderna. É autora também de Filosofia da Educação e História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil pela mesma editora.
Obras da autora:
-Qual é a graça? O bom e o mau humor
-A praça é do povo - Política e cidadania
-A bússola e a balança
-Por um mundo mais justo
-Filosofia da educação
-História da educação e da Pedagogia
-Entre a espada e a palavra
- Violência ou diálogo?
-Viver em família
- Reinventando os laços
-Maquiavel
- A lógica da força 
Análise do conteúdo dos capítulos 1, 2 e 5.
Os desafios da atualidade exigem cada vez mais criatividade e dinamicidade dos trabalhadores em educação, de forma que a reflexão da prática educativa pode ser compreendida como princípio edificador de mudanças. Nesse sentido, a obra de Maria Lúcia de Arruda Aranha nos proporcionou uma reflexão sobre conceitos básicos como o que é cultura e sua manifestação em nossos dias. Ao invés de compreender a Filosofia como uma disciplina de conteúdo e programa restrito, a autora procurou construir uma compreensão nova para o exercício de sua prática. Assim entendemos que a Filosofia pode cumprir um papel fundamental enquanto método de trabalho em educação, no sentido de estabelecer um espaço de construção da unidade entre os diversos campos do conhecimento existentes na escola, desenvolvendo uma nova relação de aprendizagem com os alunos, através de uma visão interdisciplinar e transdisciplinar da realidade.
No capitulo 2, a autora, trata de fazer uma conceitualização sobre alienação e suas manifestações cotidianas. Há vários sentidos para o conceito de alienação. Juridicamente, significa a perda do usufruto ou posse de um bem ou direito pela venda, hipoteca etc. Nas esquinas costumamos ver cartazes de marreteiros chamando a atenção dos motoristas: "Compramos seu carro, mesmo alienado". Referimo-nos a alguém como alienado mental, dizendo, com isso, que tal pessoa é louca. Aliás, alienista é o médico de loucos. A alienação religiosa aparece nos fenômenos de idolatria, quando um povo cria ídolos e a eles se submete. Para Rousseau, a soberania do povo é inalienável, isto é, pertence somente ao povo, que não deve outorgá-la a nenhum representante, devendo ele próprio exercê-la. É o ideal da democracia direta.
Na vida diária, chamamos alguém de alienado quando o percebemos desinteressado de assuntos considerados importantes, tais como as questões políticas e sociais. Em todos os sentidos, há algo em comum no uso da palavra alienação: no sentido jurídico, perde-se a posse de um bem; na loucura, o louco perde a dimensão de si na relação com o outro; na idolatria, perde-se a autonomia; na concepção de Rousseau, o povo não deve perder o poder; o homem comum alienado perde a compreensão do mundo em que vive e torna alheio a sua consciência um segmento importante da realidade em que se acha inserido.
Para Marx, que analisou esse conceito básico, a alienação não é puramente teórica, pois se manifesta na vida real do homem, na maneira pela qual, a partir da divisão do trabalho, o produto do seu trabalho deixa de lhe pertencer. Todo o resto é decorrência disso. O surgimento do capitalismo determinou a intensificação da procura do lucro e confinou o operário à fábrica, retirando dele a posse do produto. Mas não é apenas o produto que deixa de lhe pertencer. Ele próprio abandona o centro de si mesmo. Não escolhe o salário - embora isso lhe apareça ficticiamente como resultado de um contrato livre -, não escolhe o horário nem o ritmo de trabalho e passa a ser comandado de fora, por forças estranhas a ele.
Ocorre então o que Marx chama de fetichismo da mercadoria e reificação do trabalhador. O “fetichismo” é o processo pelo qual a mercadoria, ser inanimado, é considerada como se tivesse vida, fazendo com que os valores de troca se tornem superiores aos valores de uso e determinem as relações entre os homens, e não vice-versa. Ou seja, a relação entre os produtores não aparece como sendo relação entre eles próprios (relação humana), mas entre os produtos do seu trabalho. Por exemplo, as relações não são entre alfaiate e carpinteiro, mas entre casaco e mesa.
A mercadoria adquire valor superior ao homem, pois se privilegiam as relações entre coisas, que vão definir relações materiais entre pessoas. Com isso, a mercadoria assume formas abstratas (o dinheiro, o capital) que, em vez de serem intermediárias entre indivíduos, convertem-se em realidades soberanas e tirânicas.
Em conseqüência, a "humanização" da mercadoria leva à desumanização do homem, a sua coisificação, à reificação (do latim res, "coisa"), sendo o próprio homem transformado em mercadoria (sua força de trabalho tem um preço no mercado). "
No capitulo 5, Aranha (1995), faz uma divisão da ideologia em 4 características:
1-      Abstração: algo material que podem ser divinizados ou diabolizado. Exemplo: o trabalho pode ser algo bom, e em muitos casos é uma dádiva divina, pois lhe dá a estabilidade de sobrevivência ou mantém as necessidades básicas. Por outro lado o trabalho pode ser considerado “ruim”, pois priva a pessoa do lazer, do descanso, além dos perigos eminentes de doenças causadas por questões trabalhistas. O trabalho em si não é ruim, mas a ideologia impede as pessoas de refletirem sobre as péssimas condições trabalhistas.
2-      Universalização: um grupo domina o outro, impondo valores como se fossem universais. Podemos citar como exemplo a colonização da América; as propagandas; o estereotipo de pessoas (brancas, ricas) que ditam a moda; a cultura, que serve de modelo para os menos críticos.
3-      Lacuna: o que a ideologia não diz. Por exemplo, o Brasil precisa de empresas para se desenvolver, mas não dizem que com a fábrica vem a degradação ambiental e quem paga por isso, somos todos nós. Lacuna, portanto, é a impressão de um falso progresso. Não que a empresa não seja boa para o desenvolvimento, mas ocultam as conseqüências dessa implantação. Quando as propagandas divulgam a errônea ideia de que somos todos iguais, ricos ou pobres, homens ou mulheres, são pseudo-igualdade ocultadas por questões ideológicas.
4-      Inversão: essa inversão pode ser ilustrada pelo mito da caverna platônica, que confunde as sombras com a realidade. Por exemplo, colocamos valor em um objeto (tênis), mas nunca refletimos que possivelmente pessoas foram exploradas como mão de obra barata ou escrava, para a confecção do produto (tênis). A ideologia e os meios de comunicação colocam quase sempre o poder monetário na frente ao humano. Talvez essa seja a pior de todas as inversões!
Conclusão
Como método de trabalho, a Filosofia pode desenvolver uma maior capacidade de crítica do conhecimento, da escola, da sociedade e das relações humanas através de momentos privilegiados de debate em sala de aula. O contato com teorias contraditórias através de leituras e interpretações propicia um "novo olhar" para o mundo, entendendo que a "verdade" não é privilégio de um indivíduo ou de um grupo social, mas que sua busca depende da interlocução de sujeitos que se colocam na condição de pesquisadores, conscientes de que não conquistarão o conhecimento definitivamente, mas que, até por isso, estão dispostos a continuar procurando através de muito estudo e debate.
Aranha destaca que a Filosofia é a possibilidade da transcendência humana, ou seja, a capacidade que só o homem tem de superar a situação dada e não escolhida. Pela transcendência o homem surge como ser de projeto, capaz de liberdade e de construir o seu destino. Desta forma, através do estudo e reflexão sobre o texto, percebemos a necessidade de adaptar nosso planejamento à realidade da turma escolar, fazendo com que, muitas vezes, o planejamento seja reconstruído durante a própria aula, percebemos também a necessidade de desenvolver uma dinamicidade em nossa proposta pedagógica. Somente desta forma é que poderemos atingir nosso objetivo como professor: desenvolver a capacidade de reflexão crítica nos sujeitos para possibilitar a sua emancipação enquanto agentes livres e comprometidos com a evolução da cultura humana, o progresso do conhecimento e a transformação da sociedade.

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