Quando Nietzsche leu o livro “O
Mundo como Vontade e Representação (1819)”, de Schopenhauer, ele se viu completamente
enveredado pelos domínios da filosofia. Nessa obra Schopenhauer afirmava que a
verdadeira essência do homem era a vontade e não a razão. Viver é querer,
desejar. A vontade de viver era, para Schopenhauer, uma força implacável, um
instinto fundamental e cego que arrastava o homem na senda indefinida e
infinita do desejo. Segundo Schopenhauer, a dinâmica do desejo era fonte de
sofrimento. Insaciável, a vontade faz com que o homem viva a dor da
insatisfação. É preciso, diz Schopenhauer, que o homem se esforce por negar a
vontade, renunciando ao desejo e à consequente infelicidade. A vida é fonte
renovada de sofrimento: urge negar a vontade de viver, estancar a dinâmica
absurda do desejo, mediante uma existência meramente contemplativa — a arte
liberta das dores do mundo — ou pelo ascetismo.
O fascínio por esta sombria
filosofia foi superado, rapidamente, por Nietzsche. Articulando a filosofia
hindu com a crítica kantiana, o sistema exposto por Schopenhauer em “O Mundo
como Vontade e como Representação (1819)” é a análise do mundo como ilusão. A
sua moral pessimista, de Schopenhauer, fundada sobre a piedade, visa o
aniquilamento da vontade de viver, de uma vida pensada como história natural da
dor. Esse pensamento terá uma influência importante sobre a filosofia
desenvolvida por Nietzsche.
Nietzsche aceita prontamente a
ideia de que a vontade faz viver e sofrer, porém, Nietzsche não negará a vida,
não sucumbirá à fraqueza de rejeitar a vontade de viver, mesmo nos seus
aspectos terríveis e dolorosos. Para o discípulo de Diónisos, as doutrinas
ascéticas ou de renúncia à vida serão objeto de violentas críticas.
Nietzsche foi atraído para
Schopenhauer pelo ateísmo deste último, pela sua negação do sobrenaturalismo e
da transcendência, pela sua doutrina do caráter fundamentalmente irracional do
universo — num forte contraste com Hegel, que era o verdadeiro fel, tanto para
Schopenhauer como para Nietzsche — e pela sua subordinação do intelecto à
vontade. Estes elementos mantiveram-se comuns em ambos, mas, à medida que as
ideias peculiares a Nietzsche se foram desenvolvendo e foram tomando uma forma
concreta, ele chegou a verificar, a uma luz sempre mais clara, a antítese que
havia entre Schopenhauer e ele próprio. Na filosofia de Schopenhauer, o ideal
do homem é a negação da vida, ao passo que na filosofia de Nietzsche é a
afirmação da mesma vida.
Os homens não têm de fugir à vida, como os
pessimistas, mas, como alegres convivas de um banquete, que desejam as suas
taças novamente cheias, dirão sim à vida: Uma vez mais! Assim Nietzsche
desenvolveu-se fora de Schopenhauer e, se, por um lado, temos o pessimismo de
Schopenhauer combinado com um ideal predominantemente negativo de
comportamento, temos, por outro lado, o otimismo de Nietzsche combinado com um
ideal predominantemente positivo e ativo de comportamento. (Frederíck
Coppleston, Nietzsche, Filósofo da Cultura, Porto, Livraria Tavares Martins,
1979, p. 211.)
legal
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